Tuesday, February 22, 2005

Sabes, eu há dias morri...

Lembro-me perfeitamente do quão aterradora essa experiência me invadiu! Sim, porque à morte raras são as vezes em que vem a pedido, tem a péssima mania de entrar sem ser convidada, de se impor sobre os outros, e na maior parte das vezes nem sequer se apresenta, simplesmente chega. Essa é a real sensação que tive depois de morrer... é só isto? Mas morri mesmo? Apenas vejo à minha frente um homem de barbas longuíssimas, com um aspecto de quem ja não tem pachorra para aturar estas visitas inconvinientes.

Aí tenho de que explicar que não me fiz de convidado, alguém é que me obrigou a lá ir...

O velho homem nem se dignou a dizer uma única palavra, dava a sensação de já ter ouvido aquela desculpa esfarrapada vezes sem conta e de já não a suportar ouvir outra vez.

Mas quem era aquele homem? (tenho de confessar que era a imagem estereotipada que nós ocidentais temos de Deus, ou então era o Pai Natal disfarçado, mas sinceramente não o imagino tão sarcástico).

O que é que se passa?

De repente reparo que não estamos sozinhos... Reparo que Ele se encontra cercado por dois livros! Como ninguém falava comigo desde que lá tinha chegado, decidi abrir um desses livros (podia ser o livro de reclamações e já começava a ficar farto de estar morto - não é nada do que nos fazem crer enquanto vivemos -, além do mais têm um péssimo serviço).

Aquele que se encontrava à direita de Deus era o que se chama uma verdadeira enciclopédia, pelo menos era o que parecia pelo seu tamanho infindável, e poderíamos encontrar nesse livro todas as perguntas que o Homem alguma vez se questionou acerca de si próprio:

«Quem sou eu?»
«O que faço aqui?»
«O que é que comi ao almoço?», entre outras...

Todo esperançado corro para o livro que se dispunha do lado esquerdo de Deus. Estariam lá as respostas?, porque é que este livro é tão pequeno?, será que ainda consigo reservar uma mesa no Porcão? Mas esperem... ainda estou a fazer perguntas!

Com uma sofreguidão implacável e impossível de conter abro o livro e apenas leio em letras douradas:

«Depende dos dias...»

1 comment:

Anonymous said...

Excelente, magnífico, divino... este já deveria estar publicado há mais tempo carago!!!